quarta-feira, 30 de outubro de 2013


Código de Defesa do Consumidor & contratos bancários

 

Muitos não sabem, mas as atividades bancárias são de comércio, e o comerciante é fornecedor conforme prevê o artigo 3ª do Código de Defesa do Consumidor.

 

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.”

 

Por serem comerciantes, os bancos são sempre fornecedores de produtos e serviços."

 

O II Congresso Brasileiro do Consumidor incluiu como sua 9ª conclusão:

 

"O Código de Defesa do Consumidor tem aplicação imediata aos contratos com eficácia duradoura, conforme o art. 170 da Constituição Federal e art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil."

 

Neste mesmo sentido, no IV Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, realizado em Gramado no Rio Grande do Sul, no Painel sobre Serviços Bancários e Financeiros, foi aprovada, por maioria, a seguinte conclusão:

 

"As regras dos Capítulos V (Das Práticas Comerciais) e (Da Proteção Contratual), do Título I, do Código de Defesa do Consumidor, por força do disposto no art. 29, aplicam-se, sem restrição, às relações jurídicas profissionais (pessoas físicas ou jurídicas), sempre que, em concreto, evidenciada a situação de desequilíbrio entre os figurantes (vulnerabilidade em concreto).

 

 

Importante se faz a apreciação de algumas manifestações no 1º Simpósio Internacional de Direito Bancário organizado pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito Bancário e Financeiro. Para o Professor de Direito Comercial e Juiz do Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo Manoel de Queiroz Pereira Calças na palestra Princípios Fundamentais do Ordenamento Bancário Financeiro na União Européia e na América Latina entende que

 

 

“Por isso na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, que adota um conceito legal de consumidor, os Juízes tem enfrentado relevante questão de aplicar ou não, os novos dispositivos legais aos contratos bancários, quando estes são celebrados com pessoas físicas ou jurídicas que não se encartam no conceito legal de consumidor, já que exercem atividades produtivas, valendo-se dos serviços bancários, notadamente dos empréstimos e financiamentos para o desenvolvimento de atividades empresarial.”

 

Para o Professor da Escola Superior de Magistratura do Rio Grande do Sul cadeira de Direito Civil Márcio de Oliveira Puggina na palestra “A Responsabilidade Civil das Instituições Financeiras pela má Concessão de Crédito” temos que:

 

“Na legislação infraconstitucional é notável a contribuição que trouxe ao controle negocial atinente aos serviços bancários o Código de Defesa do Consumidor cujas normas são de ordem pública nos exatos termos do art. 1 do diploma consumerista:

 

Art. 1 O presente Código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem Pública e interesse social, nos termos dos arts. 5º inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.

 

Muito embora seja ainda intensa a reação de setores ligados ao Sistema Financeiro a aplicação do CDC aos contratos bancários, a verdade é  que o próprio Sistema, mesmo sem o admitir, vai, paulatinamente procedendo adaptações de sua prática negocial às exigências da legislação consumerista. Por isto é que, diante da interpretação lógica e sistemática do art. 2 e do § 1 do art. 3 do CDC, não vejo como deixar de incluir o crédito bancário entre as relações por ele tuteladas.”

 

Para o Professor catedrático da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Semy Glanz na palestra Responsabilidade Civil das Instituições Financeiras pela Má Concessão de Crédito :

 

“Os bancos tem responsabilidade profissional e, como prestadores de serviços, são regidos pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, que consagra a responsabilidade objetiva, ou seja, sem culpa. Os bancos, ao conceder créditos, devem não só informar-se e exigir as cabíveis garantias, como informar aos clientes dos riscos e limites e, se a concessão de crédito pode causar riscos a terceiros, conforme os empreendimentos dos clientes, devem medir cuidadosamente as consequências, pois passam a responder não só contratualmente, perante o cliente, mas também extracontratualmente perante terceiros.”

 

Para Adalberto Pasqualotto:

 

"Dentre os serviços de consumo, o parágrafo 2º do artigo 3º inclui expressamente os de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária.

 

A oposição destes setores econômicos ao dispositivo é manifesta. Embora o dinheiro em si mesmo, não seja objeto de consumo, ao funcionar como elemento de troca, a moeda adquire a natureza de bem de consumo.

 

As operações de crédito ao consumidor são negócios de consumo por conexão, compreendendo-se nessa classificação todos os meios de pagamento em que ocorre deferimento da prestação monetária, como cartões de crédito e cheques Está, pois, em harmonia com o sistema considerar serviços de consumo as atividades bancárias, financeiras, creditícias e securitárias”.

 

E ainda Newton de Lucca, alerta para dois pontos relevantes, que não poderíamos deixar, aqui, de mencionar. O primeiro é que, no que se refere à aplicabilidade do CDC às relações bancárias,

 

"os Pareceres emitidos em sentido contrário, conquanto provenientes de respeitabilíssimos juristas, foram encomendados por famosa entidade de classe do Sistema Bancário, a Federação Brasileira de Associações de Bancos".

 

Tal é de ser considerado.

 

O outro ponto que merece destaque é que, segundo o autor, é

 

"necessário lembrar que o dinheiro, segundo o Código Civil {art. 86}, é considerado como um bem juridicamente consumível".

 

Neste sentido temos o pensamento do jurista Demócrito Ramos Reinaldo Filho

 

“As operações bancárias foram expressamente previstas dentre as atividades prestadas sob remuneração no mercado de consumo e portanto consideradas como serviço”.

 

Destarte a visão de Ross Cranston onde

 

"As atividades bancárias típicas - recebimento de depósitos e concessão de empréstimos - obviamente envolvem o fornecimento de um serviço. O cumprimento de um pagamento a ordem do consumidor é também um serviço. Igualmente, o são os aconselhamentos financeiros, a atividade securitária, o gerenciamento de fundos de investimentos e assim por diante".

 

A propósito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, consignaram, in verbis:

 

"Todas as operações e contratos bancários se encontram sob o regime jurídico do Código de Defesa do Consumidor. Não só os serviços bancários, expressamente previstos no Código de Defesa do Consumidor 3º, § 2º, mas qualquer outra atividade, dado que o banco é sociedade anônima, reconhecida sua atividade como sendo de comércio, por expressa determinação do Código Comercial em seu Artigo 119. Assim, as atividades bancárias são de comércio, e o comerciante é fornecedor conforme prevê o caput do Código de Defesa do Consumidor no artigo 3º. Por ser comerciante, o banco é, sempre fornecedor de produtos e serviços."

 

Não há como deixar de registrar a manifestação do Dr. Otto Steiner Júnior, que, na condição de representante da FEBRABAN (entidade associativa dos bancos brasileiros), em palestra proferida na Escola Superior da Magistratura da AJURIS durante o Curso de Atualização em Direito Civil para Magistrados, afirmou tratar-se a aplicação do CDC aos contratos bancários de questão indiscutível.

 

Assim temos a visão da jurista Cláudia Lima Marques

 

"Os contratos bancários atuais são contratos cativos de longa duração. Observadas as especialidades dos contratos bancários em questão, sob o signo da continuidade dos serviços, massificação e catividade dos clientes, da prestabilidade por terceiros de serviços autorizados ou controlados pelo Estado, do macro-interesse do verdadeiro objeto contratual, da internacionalidade ou grande poder econômico dos fornecedores. E acima de tudo, continuidade das relações tendo em vista a essenciabilidade do crédito na sociedade de consumo atual, concluiu-se que os modelos tradicionais de contrato (contratos envolvendo obrigações de dar, imediatos e menos complexos) fornecem poucos instrumentos para regular estas longíssimas, reiteradas e complexas relações contratuais, necessitando, seja a intervenção regulamentadora do legislador através do CDC para a proteção dos mais vulneráveis, seja a intervenção reequilibradora e sábia do Judiciário nos casos concretos." 

 

Por conseguinte, o Banco é, sim, fornecedor, seja de serviço, seja de bem, seja de ambos.

 

Em complemento, temos Cláudio Bonatto e Paulo Valério Dal Pai Moraes concluem que

 

"o CDC, de fato, se aplica aos contratos bancários, existindo, inclusive, jurisprudência do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul reconhecendo tal aplicação até para o caso em que sejam firmados por pessoas jurídicas" .

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